FELIZ 2010 ! – 31 de dezembro, final dos anos 40, praia de Ipanema. No início eram poucos e chegavam de longe – dos subúrbios e da Baixada Fluminense, de onde houvesse um terreiro de Candomblé ou um Centro de Umbanda. Vinham de branco, em grupos, contritos e tímidos, um pouco temerosos, talvez. Afinal, a maioria esmagadora das famílias cariocas professava o Catolicismo e o temor de alguma incompreensão justificava-se. Mas eram acolhidos em paz por Ipanema, um espaço da Cidade caracterizado pela tolerância. Eram pobres, mas vinham para uma grande noite e traziam muitos brilhos,enfeites, oferendas, flores, imagens, miniaturas de barcos. À tarde já os víamos por lá, em grande faina, montando os ambientes para o culto, de formas e disposições diversas, mas sempre de frente para os domínios de Iemanjá e a África ancestral. Quanto a nós... Bem, parecia combinado, mas não era... Por volta das 10 ou 11 horas da noite os garotos da Montenegro, da Visconde de Pirajá e das outras ruas, já liberados pelos pais da ceia familiar de praxe, corriam em bandos para aquelas areias muito brancas, das quais conhecíam todos os mistérios. E percorriam a orla para lá e para cá, à busca de novidades. Ouvíamos as rezas, as evoluções, os cânticos, víamos os “passes” das Mães de Santo e até nos surpreendíamos com alguns “transes” mais fortes. Com o passar dos anos, curiosos, os adultos saíram de suas poltronas e sofás, começaram a seguir-nos e gostaram ! O pretexto era “tomar a fresca”, aproveitar a brisa generosa no auge do verão carioca e ver aquela manifestação religiosa cercada de mistério. Alguns de nossos pais, mais entusiasmados, soltavam fogos na chegada da meia-noite e já brindavam o Ano Novo com algum espumante levado de casa. A ida à praia no “réveillon” incorporou-se gradualmente aos hábitos das famílias de Ipanema. Provavelmente tudo ocorreu da mesma forma em Copacabana e no Leblon. Nascia e se desenvolvia, assim, um ritual bem carioca de ir “passar o ano” na praia. Atualmente um evento internacional gigantesco, concentrado em Copacabana para um público cosmopolita de milhões de pessoas, mas que tem ramificações similares expressivas em todas as praias da Cidade do Rio de Janeiro. Mas não nos esqueçamos: começou modestamente e fica na história carioca como herança eterna dos cultos de origens africanas que a garotada bronzeada dos anos dourados acolheu e ajudou a consagrar como manifestação cultural brasileira de importância global.
2.COP 15 – No Brasil e em muitos outros países a impressão já consolidada é de que a COP 15 foi um fracasso. Tive algumas experiências em grandes conferências internacionais e nelas pude sentir as dificuldades em chegar ao consenso sobre qualquer questão. Na verdade, pensando bem, o mundo é ainda a velha Torre de Babel, cada qual falando uma língua diferente. E continua sendo também uma grande Arca de Noé, tripulada por bichos e interesses de todas as espécies. Por azar – sejamos realistas - a COP 15 aconteceu quando o Presidente Obama tinha só uns poucos meses de Governo, o que inibiu seus possíveis voos mais ambiciosos. E seu papel, claro, era fundamental...
3. AFINAL VALEU A PENA - Harald Hellmuth, meu colega da Escola Nacional de Engenharia que entende do assunto, fez seu balanço da COP 15: “A conferência de Copenhague terminou sem alcançar nenhum dos resultados mais esperados: metas compromissadas de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa (GEE), pelo menos dos países desenvolvidos, e uma garantia de ajuda financeira aos países mais pobres. Nem os alertas de cientistas, nem a pressão da opinião pública ajudaram os Chefes de Estado presentes a encontrarem um consenso que fosse aceitável por todos os 193 países participantes. Foi tudo em vão ? Além dos condicionamentos resultantes das percepções terceiro-mundistas e dos procedimentos equivocados do encaminhamento das conversações, a consideração dos reais potenciais de contribuição de cada participante e das condicionantes a que estão submetidos precisavam ser considerados, tanto na formação de expectativas realistas como no encaminhamento de negociações. Quanto aos EUA, existe o potencial de transformar sua matriz energética, hoje fundamentada em carvão e petróleo, numa matriz com predominância das energias eólicas e solares, inclusive nos transportes, com a adoção dos acionamentos híbridos, num prazo de 15 a 20 anos (vide Plan B3.0 de Lester Brown). Mas atualmente a legislação e a estrutura fiscal ainda não estão adequadas e os empreendimentos resistem; num regime democrático o governo não pode adiantar compromissos não apoiados pelo Congresso. A China está empenhada em resgatar da pobreza centenas de milhões de cidadãos, através de um inédito esforço de industrialização e de urbanização, que a projetou para a posição de maior poluidor – não só – atmosférico. Todavia, a China desenvolve enormes esforços para aumentar a eficiência energética da economia, executa um ambicioso programa de usinas eólicas, é o maior fabricante global de painéis fotovoltaicos e de captação de energia solar para aquecimento, além de estar realizando um programa de reflorestamento em extensas áreas. A condição de regime autoritário favorece esta espantosa mobilização, mas também explica a aversão a inspeções em seu território. Atualmente, pode ser ainda impossível prever o momento em que os esforços de mitigação resultarão numa redução das emissões. A Índia apresenta condições semelhantes às da China. Com os países maiores poluidores incapacitados de se comprometer com metas, as expectativas e as programações para a COP 15 foram ilusórias. Todavia, o impasse induziu uma evolução das percepções que se materializa no texto final, que estabelece que os países deverão providenciar “informações nacionais” sobre de que forma estão combatendo o aquecimento global, por meio de “consultas internacionais e análises feitas sob padrões claramente definidos”. Esta formulação encerra o potencial de modificar de forma radical a continuação das tratativas, pois focaliza as ações devidas por cada parte e a prestação de contas diante da comunidade internacional. Caso esta reorientação se confirme, a COP 15 não foi em vão. Reconhecer-se-á então, que a conferência produziu um passo imprescindível na direção da mobilização das sociedades pelo Desenvolvimento Sustentável, ou seja, pela solução simultânea dos problemas ambientais, sociais e econômicos.” HARALD HELLMUTH
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Quanta lembrança!!! Eu também - na infãncia e acho que até os meus 20 anos - curti muito a noite de 31 dezembro na beira da praia. Só que era no Leblon, bairro onte morei por muito tempo.
ResponderExcluirLendo sua crônica, cheguei a sentir sob os meus pés o "geladinho" da areia. Na minha memória as mesmas imagens que você descreveu com tantos detalhes. Que saudade! Saudade de tudo!!! Saudade do vovô, dos meus pais que
com muita alegria me levavam, junto com as minhas duas irmãs, não só para ver a passagem do ano com todo aquele mágico ritual, como também para ver o sol nascer. Dava sorte, dizia minha mãe.
Que saudade, uma saudade sem nostalgia, mas uma saudade de um tempo muito bom.
Feliz ano novo para você e para todos aqueles que estão na corrente em torno do seu blog.
Adélia
Arlindo,
ResponderExcluirDona Celeste era a "mucama", Minha Bá negra, que deliciava a casa da RaulPompéia /atual "Nuno Pinheiro" tão conhecido seu/.
Você me deu de presente com a sua descrição da praia de Copacabana na noite- 31 de dezembro-recordações; cânticos africanos,velas alegres,cheiro de flores vivas,colares de contas,comidas coloridas, expressões negras belas,músicas e cantos de embalar...me fez reviver a minha "Mãe de Santo" que até hoje vem me visitar no berço quando tenho medo
/Eu a amava tanto que vovó vivia me dizendo que haviam me trocado na maternidade/
Obrigada/ Thereza-
...trazem de volta