22 de ago. de 2009

Pangloss no melhor dos mundos: Brasília

1. O Dr. Pangloss, otimista incorrigível criado pelo genial Voltaire, em sua obra “Candide”, deve estar fazendo um “bico” fantasmagórico na área de comunicação da Esplanada dos Ministérios. Segundo dados coletados pelo Ministério do Trabalho e divulgados como excelentes, o Brasil criou 138 mil empregos com carteira assinada em julho deste ano. Em julho de 2008 haviam sido 203 mil, o que demonstra que ainda estamos gerando postos de trabalho muito abaixo do necessário. Na soma dos sete primeiros meses de 2009 criamos apenas 438.000 empregos formais, enquanto no mesmo período de 2008 havíamos conseguido a marca de 1.465.000, mais do que o triplo deste ano. O programa habitacional, boa iniciativa do Governo, propiciou à Construção Civil o maior saldo positivo de julho (32 mil empregos). Preocupa, porém, a fraca recuperação da Indústria de Transformação que só criou 17 mil postos de trabalho e permanece no negativo. Motor do nosso crescimento, a Indústria afundará o PIB em 2009.
2. Quanto à Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE - que assinalou desemprego de 8,1% em junho e 8,0% em julho - também despertando a euforia governamental, convém lembrar que esse levantamento por amostragem domiciliar refere-se apenas a seis Regiões Metropolitanas e não tem representatividade para permitir conclusões mais profundas, já que não inclui áreas extremamente afetadas pela desocupação causada pela crise. Por exemplo, não considera a poderosa indústria paulista fora da área metropolitana e o interior de Estados cujo agronegócio reduziu muito suas exportações e desempregou. A PME é um instrumento de análise morto.
3. O esporte de competição de alto nível está no auge de seu prestígio, levando grandes multidões ao delírio e até fanatizando-as, ocupando crescentemente os principais espaços da mídia, movimentando cifras cada vez mais expressivas. E funcionando como fator relevante de mobilidade social e econômica de jovens talentosos nascidos nas famílias mais pobres. Ao mesmo tempo, infelizmente, o esporte está enveredando por caminhos tortuosos. Os fatos são eloquentes. A saúde dos praticantes é apenas uma preocupação conjuntural - enquanto necessária à performance vencedora - e o aperfeiçoamento da formação educacional e cultural dos atletas nem é cogitado, o que prejudica seu futuro. Muitos ídolos esportivos tornam-se péssimos exemplos de caráter e comportamento para as novas gerações e isso é muito negativo. Quando as motivações originais do esporte forem recuperadas e a ética voltar a ser o princípio basilar dessa atividade humana – e isso é inevitável como reação ao que anda por aí - a vitória a qualquer preço será condenada e o esporte perderá adeptos e talvez sua atual importância. Dificilmente a tendência da opinião pública mundial para privilegiar a qualidade de vida da pessoa humana se omitirá eternamente diante da inversão de valores que o esporte profissional mafioso impõe: doping, suborno, violência, ídolos estroinas, viciados e desonestos... Nada disso tem futuro. Esporte é saúde, crescimento psicológico, superação, disciplina e pertinácia, sempre tendo a ética como paradigma inabalável. Fora dessa trilha não há salvação.
4. Uma interessante discussão educacional está sendo travada nos Estados Unidos da América. A questão central é se os professores devem ser pagos de acordo com os graus acadêmicos obtidos e aumentados em função dos cursos que completarem posteriormente ou se sua remuneração deve ser função também - ou até principalmente - dos resultados escolares obtidos pelos seus alunos. A administração Obama se inclina por privilegiar a performance dos estudantes como parâmetro de valorização dos mestres. A tradição em educação é pagar com base em “treinamento e experiência” que são, porém, indicadores débeis da eficiência, eficácia e efetividade do sistema escolar.
5. Há argumentos dos dois lados a considerar. Katherine Merseth, que dirige a Harvard Graduate School of Education, afirma que nos EEUU apenas 100 dos 1.300 programas de treinamento de professores fazem um bom trabalho e que os restantes deveriam ser fechados. Por outro lado, a “burocracia”, sempre apegada rigidamente às “regras”, prefere contratar um docente medíocre com muitos diplomas do que um candidato brilhante mas sem os cursos considerados “adequados”. Além disso, qualquer professor sempre argumentará que o binômio ensino-aprendizado não é coerente, pois o mestre pode ser muito bom mas o aluno não corresponder (e vice-versa). Autoridades e educadores brasileiros deveriam acompanhar atentamente essa discussão...

11 de ago. de 2009

TAMIFLU A x TAMIFLU B

1. A REALIDADE
· O Governo Federal está dando o remédio oseltamivir (ex-TAMIFLU), com prazo de validade vencido, aos doentes da Nova Gripe. O povão está recebendo os 210 mil tratamentos que a FARMANGUINHOS encapsulou a partir de 9 milhões de doses compradas em 2006 para combater a gripe aviária.
· Apanhado pela nova pandemia em 2009, sem qualquer estoque de remédio válido, o Governo Federal resolveu dar o medicamento vencido mesmo. Parte do pressuposto que é melhor do que nada.
· A providência adicional foi firmar contrato com a ROCHE em junho de 2009, no valor de R$ 35 milhões, para comprar 800 mil doses novas de TAMIFLU - que estão sendo fabricadas agora e que – essas sim - serão garantidamente eficazes.
· Desse lote de TAMIFLU eficaz, já chegaram 50 mil doses a Brasília e as 750 mil restantes chegarão até o fim de agosto.
· Os critérios para a distribuição desses kits benditos de TAMIFLU ainda são nebulosos. Qual será a “casta” eleita para recebê-los ?. Serão os dalits ou os brâmanes ? Diga-nos, Gloria Perez !

2. O HISTÓRICO
· A partir de 2003 começamos a ter notícias, na mídia brasileira, de vítimas de uma doença denominada gripe aviária. Em Hong Kong, Bélgica e Holanda foram detetados surtos da zoonose que era passível de transmissão à espécie humana.
· Depois de 2004 surgiram focos da gripe aviária em nações produtoras de frangos de corte: Paquistão, Camboja, Coréia do Sul, Indonésia, Japão, Taiwan, Vietnã, Tailândia, China e Laos.
· Em 2006 ocorreu contaminação de aves domésticas e silvestres em diversos outros países: Índia, Iraque, Nigéria, Azerbaijão, Bulgária, Grécia, Itália, Eslovênia, Irã, Áustria, Alemanha, Egito e França. Nos países europeus os focos foram controlados rapidamente. Mas nos países do Oriente Médio, o vírus da gripe aviária matou 157 pessoas.
· Nessas alturas o Brasil, livre da zoonose, já conquistara grande fatia do mercado internacional de aves de corte e o Governo Federal, legitimamente preocupado, expediu a Medida Provisória 333/06, liberando R$ 230 milhões para um programa de prevenção e combate à gripe aviária, a ser implementado pelo Ministério da Saúde.
· Esses recursos foram principalmente usados na compra de 9 milhões de tratamentos do medicamento antiviral, já então identificado como a única arma para a cura da doença: era o Tamiflu, da ROCHE.
· A doença não chegara ao Brasil, mas talvez porque vários países adquiriram estoques gigantescos do remédio, a compra foi feita do modo tradicional. A ROCHE abriu novas fábricas para produzir exclusivamente esse medicamento, devido à forte demanda mundial.
Como se sabe, a gripe aviária não se alastrou e não chegou ao Brasil, mas ficamos com o remédio estocado. A boa prática de gestão seria fazer um contrato com cláusula para uma compra mínima obrigatória do produto, de modo a garantir viabilidade econômica ao vendedor, mas, em outra cláusula, tendo em vista que remédio é perecível e a epidemia ainda não ocorrera, dever-se-ia prever a compra adicional, apenas no caso de a doença se instalar, o que evitaria eventuais perdas.
Essa prudência, porém, pode ser discutível, em função da escassez do produto naquele momento. Talvez fosse “ pegar ou largar”. O Relenza, da GLAXO, não age contra a gripe aviária e o TAMIFLU era a saída.
Agora, quando sobreveio a Nova Gripe, em 2009, os 9 milhões de tratamentos do TAMIFLU comprado em 2006 estavam vencidos.
A ANVISA contactou a ROCHE, pedindo sua autorização para prorrogar a validade daquele lote estocado desde 2006, alegando que o produto estava bem acondicionado e que pesquisas amostrais do Ministério da Saúde atestavam sua estabilidade e qualidade. A ROCHE concordou, mas com a ressalva de que o medicamento seria encapsulado sem sua marca, apenas com a denominação do princípio ativo (oseltamivir) e teria distribuição gratuita.
Estou muito curioso para saber quem vai ser medicado com esses 800 mil tratamentos potentes de TAMIFLU. Mas desconfio que posso adivinhar, pois no Brasil, educação e saúde funcionam assim: para os “eleitos” tudo; para os inocentes eleitores aquele cruel “me engana que eu gosto”.

3.SUCESSO É CHEGAR AO FIM DA VIDA E PODER ORGULHAR-SE DE SUAS DERROTAS TANTO QUANTO DE SUAS VITÓRIAS
Arlindo Lopes Corrêa

5 de ago. de 2009

LUIZ GONZAGA, IPEA, ESPORTE DOENTE

1. SAUDADES - Já se passaram 20 anos da morte de Luiz Gonzaga - Rei do Baião - uma das figuras mais importantes da música popular brasileira, amado em todos os cantos do País e especialmente idolatrado no Nordeste. Luiz Gonzaga admirava o trabalho do MOBRAL e hoje recordo com saudade e gratidão sua doação à nossa causa.
· Fim da década dos 70, Estado do Rio Grande do Norte. A Coordenação Estadual do MOBRAL, com a heróica Lurdinha Bittencourt à frente, cuidava dos deserdados e esquecidos, com garra e generosidade infinitas. Dentro da filosofia de nosso trabalho comunitário, iniciou ações de alfabetização e educação sanitária junto a grupos de prostitutas – pequenos de início, maiores a seguir - buscando ao mesmo tempo conhecer suas necessidades, anseios e dificuldades. Depois de certo tempo, as reuniões no interior e na Capital adquiriram maior vulto.
· Atingida sua “massa crítica”, o processo educativo confluiu para o grande evento: um Encontro em Natal, com mil prostitutas de todo o Estado. Na data marcada, elas foram chegando ao galpão/ginásio esportivo, adaptado para aqueles dias de afirmação, nunca sonhados outrora. Vinham com suas melhores roupas, traziam colchonetes e pequenos farnéis. Surgiam de todos os recantos do Rio Grande do Norte. Tímidas umas, alegres outras, mas todas confiantes no reconhecimento pela sociedade potiguar de que agora existiam, eram gente, teriam voz e um apoio forte. Dias de encantamento e muito trabalho. Os funcionários da Coordenação Estadual desdobravam-se. Cozinhavam, lavavam, limpavam, faziam tudo – espírito MOBRAL ! As visitantes dormiam no chão, comiam lá mesmo as refeições de uma cozinha que não parava nem de madrugada. Tudo era improvisado, menos o programa de trabalho: palestras e debates sobre educação, saúde e higiene, direitos e deveres, relações humanas.
· No último dia os ânimos já eram outros, tinham identidade e reconhecimento social. À mesa do Encontro, entre as autoridades, a presença da Primeira Dama, a esposa do Governador.
· Quando a reunião estava acabando, já com saudades daqueles momentos inesquecíveis, foi-lhes pedido que silenciassem sua euforia incontida. E assim fizeram. De repente, puderam divisar, entrando no ginásio, aquela figura amada - quase um sonho ! - tocando sua sanfona e cantando com a voz inconfundível:
“Vai, boiadeiro , que a noite já vem
Guarda o teu gado
E vai pra junto do teu bem...”
Era o generoso “Lua” Gonzaga que, na sua grandeza moral, homenageava aquelas mulheres erguidas do chão. Trazia seu apoio voluntário à nossa realização pioneira: Primeiro Encontro de Prostitutas do Rio Grande do Norte. Certamente, também, o primeiro realizado no Brasil com apoio governamental. Lições do MOBRAL...
· Fica com Deus, Luiz Gonzaga, sertanejo cantador, brasileiro de talento inigualável e coração de ouro !

2. VENDENDO A ALMA - O IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal, anuncia ter mudado sua previsão de crescimento da economia brasileira para 2009. Passou-a de 2% para uma faixa que pode variar entre 0,2% e 1,2%. Em outras palavras: antes, apresentara uma previsão totalmente irrealista, para ficar em sintonia com o “otimismo” oficial. Agora, parte para uma futurologia discutível, dando um “chute” dentro de uma gama de variação de 500% ! Para uma instituição que já foi um modelo de competência, trata-se da mais transparente confissão de debilidade técnica e docilidade política.
· Mas não é para menos. O IPEA, onde tive a honra de trabalhar durante 7 anos (1965-1972), em época na qual funcionava com total liberdade de crítica, tornou-se um órgão político, servil aos poderosos do momento, “chapa-branca”. Demite quem desobedece à linha do Governo, inventa concursos em que privilegia quem reza pela cartilha do esquerdismo mais retrógado e publica estudos e pesquisas com resultados... digamos...“convenientes”. Agora mesmo, está sendo contestado seu estudo afirmando que pobreza e desigualdade diminuíram.
3. VENDENDO CORPO E ALMA – O profissionalismo no esporte continua mostrando sua face mais sórdida... De 44 escolhidos para representar o Brasil na próxima competição internacional de atletismo na Alemanha, 5 foram apanhados no exame antidoping, representando portanto 11% do total de selecionados. Um resultado estarrecedor que deveria levar nossos dirigentes desportivos a uma profunda reflexão sobre as políticas vigentes de recrutamento, seleção, treinamento e utilização de atletas brasileiros em competições de alto nível.